Pesquisa vê pulverizações como caso de etnocídio da população Guarani Kaiowá em Mato Grosso do Sul
O solo e a água de regiões de Mato Grosso do Sul estão contaminados por agrotóxicos, impactando diretamente a saúde da população. Uma pesquisa recente, realizada pela Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva) e a ENSP (Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca), concluiu que os indígenas e as mulheres são os mais afetados por essa contaminação.
O estudo, que resultou no Dossiê de Danos dos Agrotóxicos na Saúde Reprodutiva, focou em áreas de conflito indígena em Caarapó, Mato Grosso do Sul. Análises de amostras de água da chuva, água de poço artesiano, água superficial (rios), plantas medicinais, frutos do cerrado, alimentos da roça, carnes de peixe (pacu e lambari), caça (ema e porco-do-mato) e mel, coletadas entre 2020 e 2021 na TI Tirecatinga, detectaram contaminação por agrotóxicos.
Os resultados mostraram que 90% das amostras de plantas do Cerrado continham resíduos de 11 diferentes agrotóxicos, com uma média de quatro agrotóxicos por amostra. Dentre os agrotóxicos encontrados, 45% são proibidos na União Europeia.
Há relatos de diminuição na produção de frutas e adoecimento de animais durante períodos de intensa aplicação de agrotóxicos nas lavouras próximas à terra indígena.
Denúncias e falta de ações
O relatório destaca que há 15 anos são feitas denúncias de pulverizações aéreas e terrestres ilegais sobre a comunidade Guyraroká, além de outras violações de direitos. A pesquisa aponta que Mato Grosso do Sul é cenário de frequentes denúncias de violações de direitos humanos, especialmente contra comunidades indígenas e trabalhadores rurais.
Mesmo durante o vazio sanitário da soja, foram detectados resíduos de vinte diferentes ingredientes ativos de agrotóxicos, com 90% das amostras contendo misturas de dois a doze tipos diferentes. Amostras de água da torneira e de nascentes também apresentaram contaminação.
Como solução, a pesquisa sugere o fortalecimento das lutas dos povos indígenas pela defesa de seus territórios, a criação de áreas livres de agrotóxicos e transgênicos, a proibição de práticas agrícolas destrutivas ao redor das Terras Indígenas e o incentivo à agroecologia.
Etnocídio da população Guarani Kaiowá
A pesquisa da Abrasco e da ENSP coloca a questão indígena do estado do Mato Grosso do Sul como “um típico caso de ecocídio promovida pelo agronegócio da região, um etnocídio da população Guarani Kaiowá”.
Pois mais do que substâncias tóxicas lançadas no ambiente, os agrotóxicos “são uma das estratégias de etnocídio dos povos Guarani-Kaiowá que, sobreviventes ao espólio de seus territórios, estão confinados em pequenas áreas nas quais a pulverização aérea e terrestre sobre suas casas é cotidiana”.
Uma das conclusões desse estudo é a de que os trabalhadores rurais e as populações de territórios expostos e contaminados por agrotóxicos encontram obstáculos para denunciar as violações, sobretudo no que se refere à documentação comprobatória dos danos sofridos.
“Os responsáveis por esses crimes, geralmente, são grandes empresas e fazendas, que permanecem impunes”, afirma o dossiê.