Cadeirante, cego e autista relatam histórias de preconceito e superação em MS
De acordo com o levantamento mais recente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2022, a Pesquisa Nacional de Amostra Contínua (PNAD) da Pessoa com Deficiência, quase 9% da população de Mato Grosso do Sul possui algum tipo de deficiência. O percentual equivale a cerca de 200 mil pessoas no estado. Apesar do número expressivo de pessoas, ainda há relatos de desafios estruturais para atender as pessoas com deficiência Intelectual ou Múltipla.
Um exemplo de superação é a aposentada Ana Lúcia Serpa de 50 anos. Ela teve poliomielite aos 9 meses de idade e convive com as sequelas da doença impuseram sua sobrevivência atrelada à cadeira de rodas. Estudar e trabalhar foram alguns dos desafios enfrentados por Ana ao longo dos anos.
“Na época, até pra estudar, não tinha condições. Pois naquela época não existia escola acessível, não tinha professores qualificados, né? E foi uma batalha muito árdua mesmo pra mim estudar. Minha mãe trabalhava em uma escola e ela era faxineira dessa escola, então ela conseguiu que, através da Secretaria de Educação, de uma carta, porque a diretora, na época, não me aceitava, ela conseguiu me colocar lá porque ela trabalhava no mesmo período que eu estudava, então ela me assessorava”, relembrou a aposentada.
Sobre as lembranças das barreiras enfrentadas por pessoas com deficiência, a aposentada rememorou algumas histórias da infância, mas também da vida adulta. Um dos momentos mais fortes enfrentados por ela ocorreu numa tentativa de ingresso no mercado de trabalho. Apesar da qualificação para o cargo a barreira arquitetônica e a falta de vontade para colocar em prática a inclusão a impediram de assumir a função.
“Eu fiz um curso onde eles estavam recrutando pessoas com deficiência para trabalhar. Eu fiz o curso, passei, precisava do trabalho, porque era um trabalho que era bem remunerado, passei em primeiro lugar, e pronto, achando que eu poderia estar trabalhando, recebi uma ligação, sem nenhum preparo, dizendo que eu passei em tudo, mas que eu não iria ser contratada, porque o prédio não era acessível. Se o prédio não era acessível, por que deixou eu fazer o curso?”.
Cego há sete anos, Antônio Soares, de 70 anos, perdeu a visão em decorrência de um glaucoma. Apesar da perda total em 2017, ele começou a perceber a redução na capacidade visual de forma gradativa a partir de 2009. Para ele, a maior dificuldade além da acessibilidade é o próprio entendimento das pessoas sobre a deficiência. Segundo Antônio muita gente, principalmente quem não tem contato com pessoas com deficiência não compreende as necessidades. Mesmo com muitas dificuldades, ele disse que já observa evolução de atendimento em alguns locais.
“Outra coisa que a gente também vê, também, são locais que você não tem a referência. Por exemplo, piso tátil. O piso tátil é uma referência para o cérebro, né? E calçadas mal conservadas. Alguns restaurantes hoje, quando você chega e eles percebem que você é cego, eles disponibilizam um atendente pra você. Até você pegar o almoço e sentar na mesa. Lojas também. Banco, por exemplo. No meu banco eu ligo antes, eles deixam uma pessoa na frente da agência à minha disposição. Então, essa dificuldade eu não tenho”, refletiu.
Ao longo da vida, a escritora Melissa Mecenas Oshiro, muitas vezes se sentiu como um peixe fora d’água. Isso porque algumas situações ela se sentia diferente das outras pessoas. Há pouco mais de dois anos quando buscava informações para o atendimento especializado para filha de 7 anos, ela entendeu que se enquadrava no espectro autista.
‘Para mim, receber o diagnóstico de autismo foi uma grande surpresa, porque eu estava em busca de atendimento para a minha filha. E daí, quando a psicóloga identificou em mim muitos traços de autismo, eu comecei a entender toda a minha história de vida. E apesar do início ter sido um pouco de surpresa, as coisas foram fazendo sentido conforme eu conversava com ela e conforme eu ia relembrando a minha infância, adolescência, até a fase adulta”.
Com seis obras publicadas e mais produções a caminho, a escritora disse que a literatura foi sua forma mais completa de interagir com o mundo.
Com a informação CBN Campo Grande.