A comunidade Guarani-Kaiowá da retomada Guaaroka em Douradina no sul do Estado, recebeu aviso de despejo nesta sexta-feira (02), uma semana após a liminar que estabelecia reintegração de posse à favor de produtores rurais das terras ocupadas. O prazo para a saída é de cinco dias.
Segundo o CMI (Conselho Indigenista Missionário), a situação de conflito na região foi intensificada depois de um casal armado e com uma camionete, entrar em duas retomadas da terra Indígena: Kurupa’yty e Pikyxyin, e ferir um indígena nesta quinta-feira (2).
Os suspeitos pelos ataques foram presos pela Guarda Nacional na mesma data. Conforme o Cimi, os indígenas receberam um prazo para a saída da área sem o uso de força policial.
Guaaroka é uma das sete ‘retomadas de Douradina’, município onde está a terra indígena, ao lado da retomada Yvy Ajere, local onde segundo o Cimi, há concentração de pessoas armadas em um acampamento a poucos metros dos barracos Guarani e Kaiowá.
Um dos integrantes da comunidade questiona a ação da justiça.
“Queremos saber que tipo de diálogo querem fazer com o nosso povo nessa pressão de despejo. Tem ameaça aqui de jagunço, tem ameaça que vem da Justiça. Como querem conversar assim, ameaçando a gente? Inclusive tinha uma proposta de colocar a comunidade das outras retomadas nesta área. Se a gente tivesse aceitado, todo mundo seria despejado agora. Tudo uma mentira! Não vamos desistir da nossa terra do jeito que é certo”, diz um Guarani e Kaiowá da TI Lagoa Panambi.
O indígena se refere a uma proposta que surgiu durante as duas reuniões de mediação entre indígenas e a classe de produtores rurais no Ministério Público Federal (MPF), na última semana.
Na ocasião, a defesa da comunidade informou que a proprietária da fazenda de 150 hectares, ocupada pela Guaaroka, decidiu não patrocinar investidas contra os indígenas, preferindo o caminho da Justiça, além de topar negociar a área em permuta por terras em outra localidade.
A entidade afirma que a postura da produtora rural “desagradou” a Famasul (Federação da Agricultura e Pecuária do Mato Grosso do Sul), entendendo como uma desistência por parte da proprietária. Ainda segundo o Cimi, diante da situação, o grupo ruralista propôs que os Guarani e Kaiowá se retirassem das outras retomadas de terras em troca destes 150 hectares.
Além dos indígenas não terem aceitado a ideia, lembraram da reintegração de posse, ação judicial que os advogados da proprietária afirmaram que não iriam abrir mão.
Qual o posicionamento da classe Rural?
A Famasul (Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul), entidade que está participando dos diálogos sobre as demarcações de terras indígenas, tanto em âmbito estadual como a nível nacional, afirmou o seguinte:
“O posicionamento da Federação é pela paz no campo, respeitando ambos os lados e a temporalidade para a solução das invasões. No caso de Douradina, em reuniões no Ministério Público Federal em Dourados, não foi diferente. Ocorre que, a proposta apresentada resolveria a situação de apenas três produtores, dos 325 pequenos produtores rurais da região, o que não corrobora com o entendimento coletivo de que a temporalidade deve ser respeitada e que a proposta poderia aumentar a insegurança jurídica. Entretanto, a Famasul deixou claro que os produtores têm livre escolha para decidir sobre a proposta.
Sendo assim, reiteramos nosso compromisso pela paz no campo, ressaltando que os conflitos não são benéficos para ambos os lados”, finaliza o documento.
A retomada Guaaroka inaugurou este último período de retorno dos Guarani e Kaiowá para territórios, ainda em posse de terceiros, da Terra Indígena Lagoa Panambi, cujo Relatório Circunstanciado de Identificação de Delimitação (RCDI) foi publicado em 2011 garantindo 12 mil hectares para a demarcação.
No dia 13 de julho, os indígenas retomaram Guaaroka e sofreram um primeiro ataque. Um indígena foi baleado e outros feridos por tiros de bala de borracha disparados por policiais militares. Em resposta à violência sofrida, os Guarani e Kaiowá decidiram retomar Yvy Ajere.
O Correio do Estado entrou em contato com a Funai (Fundação Nacional do Índio), para obter esclarecimentos em relação à situação dos indígenas e até quando permaneceram no local, mas até o fechamento dessa reportagem, não obtivemos resposta.