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Cemitérios municipais passam por abandono e superlotação

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Em necrópoles mais antigas, o necrochorume se torna mais um problema; ao infiltrar o solo e carregar bactérias e metais pesados, há contaminação de águas

Campo Grande conta com três cemitérios municipais, que sofrem com furtos e falta de espaço, estrutura e cuidado ambiental. O Correio do Estado visitou essas necrópoles e conversou com o gestor desses espaços que servem de descanso eterno após o último suspiro.

Os problemas são inúmeros, desde a falta de marcação das quadras e lotes, o que dificulta a localização no terreno, até túmulos e jazigos abandonados, que transformam os cemitérios em verdadeiros campos dos esquecidos, o que gera um sentimento de tristeza, não apenas pelo que o local guarda e representa, mas, sim, pela situação como se encontra.

No Cemitério São Sebastião – popularmente conhecido como Cruzeiro – e no Santo Amaro, é comum encontrar acúmulo de materiais de construção misturados com lixo, algumas vezes até mesmo em cima de túmulos ou dentro de jazigos, que em sua maioria estão com vidros quebrados, sem porta e queimados por velas.

Garrafas e latas de tintas abertas e cheias de água foram encontradas sem dificuldade nos túmulos e nos monumentos centrais dos locais, onde em torno da cruz também há chão queimado, acúmulo de cera de vela, lixo e água parada, o que pode vir a ser um grande foco de dengue.  

A terra invade os caminhos de cimento e se confunde com a terra das covas e os cacos de vidro. Se torna impossível não notar também o líquido que sai de alguns túmulos e molha a terra por onde as pessoas pisam. Esse problema foi visto mais vezes no Santo Amaro, onde, durante a seca, apenas em volta dos túmulos estava molhado.

Ao Correio do Estado, o gestor dos cemitérios públicos, Marcelo Fonseca, explicou que necrópoles mais antigas têm mais problemas pela época em que foram construídos.  

Fundado em 1914, o mais antigo da Capital é o Cemitério Santo Antônio, seguido por Cruzeiro, com data de fundação em 1960, e Santo Amaro, que foi inaugurado em 1961.  

“A limpeza dos túmulos e jazigos é de responsabilidade dos familiares que compraram o lote para enterrar os entes queridos, nós não podemos mexer, eles que devem cuidar”, esclarece Fonseca.

Sobre os materiais de construção encontrados, o gestor disse que cemitérios estão constantemente em obras, por abrir covas, então, é algo comum e sempre haverá uma caçamba por perto para recolher os entulhos semanalmente. Porém, não responde como acúmulos de lixo e instrumentos de obras “moram” nos jazigos e nos túmulos.

SUPERLOTAÇÃO

Sobre o problema de superlotação e a falta de planejamento para a construção de um quarto cemitério em Campo Grande, Fonseca disse que, “aproximadamente, são 34 mil sepulturas no Cruzeiro e 45 mil no Santo Amaro, falta espaço. Em 2019, que foi quando a Secretaria Municipal de Infraestrutura e Serviços Públicos [Sisep] assumiu os cuidados dos espaços, todos os três já estavam saturados”.

Procurado pelo Correio do Estado, o secretário da Sisep, Rudi Fiorese, disse que ainda não há um planejamento para a construção de um novo cemitério público na Capital.

PROBLEMAS COM GAVETAS

Questionado sobre a questão do necrochorume, Marcelo Fonseca explicou que a solução são as gavetas, porém, o problema é mais complexo do que parece, pois os responsáveis pelos sepultamentos são os familiares.  

“O Santo Antônio tem, em maioria, gavetas, porém, os corpos enterrados em solo ainda são uma realidade e fazer uma gaveta não é barato, a gente não tem como obrigar que a família faça isso, mas também não podemos abrir e mexer. Os cemitérios Santo Amaro e São Sebastião já têm um índice bem mais baixo de gavetas, porém, por serem locais antigos, não temos dados de quantas sepulturas são gavetas e quantas são solo, mas, de forma crítica, a maioria está em solo”, contou.  

Ele também explica que não podem proibir que o enterro aconteça, caso não exista a gaveta. 

“A família chega lá de imediato, de luto, muitas vezes sem condições financeiras para conseguir fazer a gaveta, e não podemos proibir, não temos como evitar que o enterro seja no solo, porém, a pessoa assina um termo que, em um prazo de cinco anos, ela terá que readequar o lote, sob pena de não poder usá-lo novamente para novos sepultamentos”, comentou.

O gestor também explica que a prefeitura só pode mexer nos túmulos vazios. 

“Não podemos violar os túmulos, só posso abrir depois de cinco anos. Existe uma lei de 2001 que fala sobre isso, e não teve atualização desde então. Licitação ambiental demora, e o cemitério depende dos titulares dos lotes. Já fizemos o primeiro edital chamando as famílias para efetuar a devida manutenção e vamos fazer uma segunda chamada pelo Diário Oficial de Campo Grande”, explicou Fonseca.  

NECROCHORUME

A decomposição dos corpos cria o necrochorume, que, se não houver uma proteção, pode atingir o lençol freático e contaminar a água. Os mais atingidos seriam os bairros em torno dos cemitérios.  

Porém, Fonseca garante que isso não acontece em Campo Grande, pois “as águas que abastecem as casas não vêm do lençol freático, porém, poderia ser um problema para quem tem poço artesiano, prática que é proibida”.

O líquido humoroso, conhecido como liquame ou necrochorume, é descrito como um líquido escuro de cor acastanhada e ácido, de cheiro típico e desagradável, proveniente da decomposição dos cadáveres a partir de reações e processos físicos, químicos e biológicos.  

A substância se infiltra no solo e carrega bactérias, vírus, metais pesados, nitratos e fosfatos, além de outras substâncias poluentes, que contaminam o lençol freático (reservatório de água subterrânea proveniente da água da chuva infiltrada no solo) e, consequentemente, córregos e rios.  

Se as mesmas fluírem para a área externa do cemitério e forem captadas por meio de poços escavados por populações que vivem no entorno, estas poderão correr sérios riscos de saúde e se contaminar com patogenias graves, como tétano, tuberculose, febre tifoide, hepatite A e outras.  

MINISTÉRIO PÚBLICO

Conforme noticiado pelo Correio do Estado no mês de julho, o Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul (MPMS) entrou com um pedido de interdição do Cemitério Santo Antônio, na região central de Campo Grande, por uma ação civil pública de 2011 com sentença no ano de 2019.

Protocolada no dia 6 de junho deste ano, a promotora de Justiça Andréia Cristina Peres da Silva apresentou ação de cumprimento de sentença para que o município desse informações sobre a regulamentação da licença do cemitério.

Segundo a promotora, caso o cemitério não esteja regular, deverá ser interditado até a devida regularização. O objetivo da interdição seria evitar que o necrochorume, material formado pela decomposição de cadáveres, contamine o lençol freático. 

Também pediu a suspensão dos sepultamentos por inumação no solo, até que seja comprovada a adequação das covas e a aprovação do estudo de investigação detalhado do passivo ambiental da área.

O MPMS apontou que a licença do cemitério expirou em 2011 e apenas neste ano que uma nova autorização foi solicitada, mas teria sido concedida sem a regularização completa e ignoraria o parecer técnico da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Gestão Urbana (Semadur).

A Semadur apontou uma série de irregularidades, entre elas, o acúmulo de resíduos entre os jazigos, a aparente falta de drenagem e os túmulos danificados. Os técnicos da secretaria constataram que existe risco de o solo e a água serem contaminados.

Conteúdo retirado do Correio do Estado.

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