Alvos dos crimes tinham entre três e 11 anos e circulavam com livre acesso à casa do investigado
Após a prisão do auxiliar de pintor, de 55 anos, suspeito de estuprar, pelo menos, cinco crianças, no município de Rio Negro, as investigações da Polícia Civil continuarão para verificar se os pais das vítimas têm participação nos crimes cometidos.
Em entrevista coletiva na tarde de ontem, o delegado titular da Delegacia de Rio Negro e responsável pelo caso, Gabriel Cardoso, explicou que será preciso apurar o papel dos responsáveis das crianças no crime, já que eles podem ter tido participação ativa, colocando seus filhos em situação de exploração sexual ou se omitido diante das acusações.
O delegado explica que os estupros eram cometidos contra as vítimas após o acusado estabelecer uma relação de confiança com elas, dando dinheiro, alimentos e objetos de valor, e isso pode ter sido feito com o consentimento dos pais e responsáveis.
“Como é um bairro pobre de Rio Negro e as famílias vivem em situação de vulnerabilidade, ele provia alimentação, oferecia dinheiro e outros objetos de interesse das crianças como forma de conquistar a confiança delas”, explica Cardoso.
As investigações ainda mostraram que, embora o suspeito declare que é auxiliar de pintor, ele também obtém renda com aluguéis de imóveis, o que faz com que sua condição financeira seja um pouco maior que a dos outros moradores da região e, dessa forma, poderia dar presentes e suprir as necessidades básicas das suas vítimas, como forma de comprar o silêncio delas.
A polícia ainda explicou que, por conta dessas atitudes, as crianças criaram uma relação de dependência econômica e afetiva com o investigado, o que interferiu bastante nas investigações.
Em depoimento à polícia, as mães confirmaram que as crianças tinham livre acesso à casa do homem, inclusive isso era autorizado por elas, que chegavam a deixar as vítimas aos cuidados dele enquanto saíam para trabalhar.
Cardoso ainda detalhou que, durante as primeiras fases das diligências, foi pedido que as vítimas fossem ouvidas por meio do depoimento especial, no Fórum da comarca, mas o que elas relataram surtiu pouco efeito prático para as acusações.
Mesmo com todos os direitos assegurados, os menores não relataram nenhuma situação de abuso sexual ou algo semelhante, o que levantou suspeitas de que elas estavam omitido informações, atitude que pode ter sido induzida por alguém com consciência dos abusos.
“Elas tinham uma relação de confiança com ele, e se isso é estabelecido já na primeira infância é difícil de ser desconstruído”, afirma.
O delegado ainda aponta que outro obstáculo para obter uma acusação robusta foi a negativa dos pais das crianças, que estavam resistentes em colaborarem com as investigações e, inclusive, chegaram a negar que os estupros e outros abusos teriam acontecido.
“As mães alegam que confiavam no homem e deixavam seus filhos irem à casa do acusado enquanto trabalhavam”, destaca.
Durante as diligências, as crianças foram submetidas a exames de corpo de delito, onde foi constatado que o acusado cometeu os crimes de forma que não deixasse vestígios.
Os menores continuam em casa sob a guarda dos pais até que Ministério Público e o Conselho Tutelar decidam se é preferível que elas sejam afastadas da convivência dos responsáveis.
INVESTIGAÇÕES
No histórico traçado pela polícia, a primeira denúncia contra o investigado data de janeiro de 2017, quando uma mulher compareceu à delegacia da cidade e relatou que sua filha de três anos teria sido abusada pelo homem.
Na época, ela contou que tudo aconteceu durante uma confraternização, e ela viu o momento em que o acusado “acariciava” as partes íntimas na menina. Entretanto, as pessoas que estavam presentes foram ouvidas, mas não confirmaram o ocorrido.
“Ninguém falou sobre em desfavor do acusado e não tínhamos provas, mas, a partir desse fato, já ficamos em alerta com ele, até porque a mulher disse que ele tinha acesso a outras crianças e o exame de corpo de delito confirmou que algo teria acontecido com a criança”, detalhou Cardoso.
Já em 2020, o Conselho Tutelar da cidade reportou ao delegado que um menino de nove anos estava morando com o homem sem que ele tivesse sua guarda legal e havia indícios de que a criança estava passando por abusos sexuais na residência.
No mesmo ano, enquanto as investigações contra o acusado eram retomadas, outra denúncia foi registrada na delegacia. Dessa vez, uma mãe dizia que seu filho de seis anos tinha sido estuprado enquanto estava na casa do auxiliar de pintor.
Como os depoimentos das crianças não tiveram resultados e não havia prova do crime, foi preciso entrar na Justiça com um pedido para que a casa do acusado fosse monitorada por meio de captação de som e imagem feita pelo Departamento de Inteligência da Polícia Civil de MS (DIP).
“Infelizmente, os depoimentos especiais não poderiam resultar na continuação da investigação. Então, representamos um pedido de captação ambiental na residência do investigado, onde estariam sendo cometidos os abusos”, explica Cardoso.
Dessa forma, foi preciso um pouco mais de um dia para que o flagrante fosse feito por meio da captação do DIP, quando, na terça-feira (13), os policiais viram por meio das câmeras que o homem estava dormindo acompanhado de um menino e o “acariciava” e uma forma que já configurava estupro.
No entanto, a prisão em flagrante aconteceu apenas no dia seguinte, quando foram captadas cenas de sexo explícito entre ele e dois meninos de 11 anos.
De acordo com o delegado, os crimes eram tão constantes que as vítimas naturalizavam os abusos, em que elas chegavam a se entreter com um celular enquanto o homem cometia os atos sexuais.
“Diante dessa informação, eu acionei imediatamente a equipe policial que já estava à disposição e conhecendo o caso para que o sujeito fosse preso em flagrante. Ele foi preso e conduzido para a delegacia, onde permanece até hoje e com a prisão preventiva já decretada”, detalha. Conteúdo retirado do Correio do Estado.